segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Sistema Administrativo adotado pelo Brasil. Principais distinções entre o sistema inglês e o francês.

Sabe-se que à Administração Pública foram conferidas certas prerrogativas impraticáveis pelos particulares. Isso porque, dentre as suas atribuições, ela sempre deve buscar a efetividade do princípio da supremacia do interesse público sobre o particular.
Contudo, em um “Estado Democrático de Direito”, a Administração Pública, mormente voltada para a consecução do interesse público, limita-se a restrições previstas tanto pela Constituição Federal quanto pelas legislações infraconstitucionais. Tais restrições, outrossim, principalmente amparadas pelo princípio da indisponibilidade do interesse público.
Em síntese: a atuação administrativa encontra barreiras intransponíveis no próprio ordenamento jurídico que, por sinal, regula a sua conduta frente à sociedade, tentando evitar atitudes arbitrárias dos administradores sobre os administrados.
Ocorre que, nem sempre, o direito material é respeitado. Quero dizer: nem sempre a administração (o administrador) pauta a sua conduta em estrita obediência ao que entoado pela lei ou, até mesmo, pela própria Carta Maior, desrespeitando, por vezes, com a sua comissão ou omissão, o administrado.
Isto posto, indaga-se: lesado por uma conduta administrativa, estaria o particular obrigado a recorrer às instâncias administrativas ou, independentemente desas, poderia, de imediato, socorrer-se ao Poder Judiciário? A resposta, contudo, depende do sistema administrativo que foi acolhido pelo ordenamento jurídico pátrio de determinado país.
Atualmente, dois sistemas merecem especial enfoque, quais sejam, o francês e o inglês. Aquele, adotando a dualidade jurisdicional, confere à Administração Pública parcela da jurisdição, impondo o necessário contencioso administrativo para as causas em que ela seja parte. Fazendo uso de outras palavras: o particular, lesado por uma conduta administrativa, não poderia recorrer ao Poder Judiciário, mas, sim, única e exclusivamente, à própria administração e sua decisão, dotada de jurisdição, faria coisa julgada material. Por sua vez, o sistema inglês determina que o titular exclusivo da jurisdição é o Poder Judiciário e as decisões emanadas pela Administração Pública, em um procedimento administrativo, não seriam dotadas do instituto da “coisa julgada”, podendo ser revistas pelo Poder supra-aventado.
O Brasil, como se percebe, adotou o sistema inglês, não existindo, em nosso ordenamento, o já mencionado contencioso administrativo. Ou seja, aqui, o particular lesado pela administração possui três possibilidades: a) recorrer à Administração Pública e esperar a sua decisão última, ciente de que, a posteriori, pode valer-se do Poder Judiciário; b) ignorar as instâncias administrativas e, de imediato, valer-se das instâncias judiciais; ou c) recorrer à Administração Pública e, antes de sua decisão última, abandonar o procedimento administrativo para buscar amparo no detentor único da jurisdição.
E a adoção a esse sistema fica amplamente demonstrada quando nos debruçamos na Carta Magna do 1988, especificamente em seu art. 5°, inciso XXXV, que estabelece: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”.
Porém, aligeire em sublinhar que a inafastabilidade do Poder Judiciário não é um princípio de obediência absoluta. É que, enquanto a própria Carta Constitucional expressamente o excepciona, mesmo que temporariamente, nos dissídios desportivos, a jurisprudência do STF exige, como condição imprescindível para a impetração do Habeas Data, a recusa administrativa em fornecer as informações que o impetrante tem direito de saber.
Outro ponto digno de nota é que, mormente o particular, no Brasil, possa buscar a tutela juducial, posteriormente da administrativa, tal prerrogativa, por questões lógicas, não é conferida à administração. Ora, se foi dela que emanou a decisão administrativa, não pode ela valer-se do Judiciário para tentar desconstituir sua própria decisão.

Luiz Ferreira Tôrres Neto[1]

[1] Advogado e pós-graduando em Direito Constitucional.

Nenhum comentário: